2. O dado espacial na Vigilância em Saúde

A análise espacial é muito utilizada para avaliação dos determinantes de saúde e doença pela Vigilância em Saúde. Organizar dados espaciais ao longo do tempo pode evidenciar e caracterizar fenômenos de saúde vinculados ao local geográfico onde ocorrem. É importante ressaltar que, para a epidemiologia, os processos de saúde e doença são invariavelmente afetados pelos determinantes socioambientais. Dessa forma, para o bom desenvolvimento das ações de vigilância, é fundamental determinar se eventos podem ter desfechos diferentes a depender da sua localização.

Para entender o contexto dos dados espaciais na Vigilância em Saúde, vamos falar um pouco sobre quais os dados espaciais disponíveis na Vigilância em Saúde, o nível de detalhamento e a sua classificação geral.


Neste curso, os termos espaço e espacial se referem aos objetos geográficos do mundo real, como ruas, hospitais, casas, rios, bairros, e sua localização. Tudo que está na superfície terrestre possui uma posição, uma referência espacial. Muitas vezes, esta posição é coletada por meio de endereços e convertidos em códigos (coordenadas) que registram a localização. Veremos mais à frente com detalhes. Não se preocupe.


2.1 Quais os dados espaciais da Vigilância em Saúde?

Uma pergunta que pode aparecer quando trabalhamos com mapas é: “Onde estão os dados espaciais na vigilância?”.

Na Vigilância em Saúde, os dados espaciais podem ser encontrados nas localizações dos eventos ou dos acometidos pelos eventos. Geralmente, são registrados como o endereço de ocorrência ou de residência de um caso ou como a região de nascimento e morte. É também possível o registro por meio do CEP ou da área de cobertura das ações de uma unidade básica de saúde. Você, no dia a dia de sua vivência, colabora para a produção desses dados.

Os campos de registro para estes dados estão presentes em, praticamente, todos os formulários da saúde como prontuários, fichas de notificação de casos e registros de vacinação. Também os sistemas de informação da saúde possuem campos para esses registros. Mas, no cenário atual, esses dados são preenchidos em campos abertos, sem padronização. Dessa forma, na hora da digitação, há muitas chances de inconsistências e erros, que necessitam de um árduo trabalho para serem corrigidas.

De modo geral, esses dados integram a análise de situação de saúde enquanto uma categoria para explorar padrões relativos ao espaço. Nesse sentido, a Vigilância em Saúde pode:

  • realizar o mapeamento de doenças, análise clássica que compara onde os fenômenos ocorreram e busca identificar áreas de risco mais alto,
  • fomentar estudos que revelam padrões que não eram previamente reconhecidos e ajudar a formular hipóteses sobre a causa dos fenômenos,
  • analisar padrões na ocorrência de uma doença e investigar os mecanismos que a causam,
  • coletar dados espaciais, e
  • orientar políticas e ações para controle e prevenção de doenças, agravos e eventos relacionados à saúde.


2.2 Nível de detalhe dos dados espaciais que podem ser utilizados na Vigilância em Saúde

Quando citamos nível de detalhe, estamos nos referindo à disponibilidade de dados para análise conforme a necessidade do analista. É, portanto, um dos fatores mais decisivos para que alguma análise seja feita. Sem dados disponíveis, não há como a elaborar algum material que represente adequadamente o fenômeno de interesse, seja na escala espacial ou na escala temporal.

De modo geral, os microdados com alta frequência de atualização são preferíveis. Microdados são aquelas bases de dados onde cada linha se refere ao registro de indivíduo apenas, com suas características demográficas gerais e clínicas, mas devidamente anonimizado.

Alguns anos atrás, os sistemas de informação em saúde não dispunham de exportação eficiente que permitissem análises elaboradas com microdados. Além disso, os computadores eram menos potentes e restritos a equipes técnicas em grandes centros. Na grande maioria dos municípios brasileiros não havia capacidade instalada para tal pretensão.

Atualmente, há muitos avanços na área de ciência de dados que refletem diretamente na área da saúde. Dados em escalas mais finas (os microdados) são disponibilizados semanalmente e APIs oferecem uma forma de acesso ágil (API do inglês Application Programming Interface, que se refere a um conjunto de métodos e protocolos de comunicação via web, principalmente).

Abaixo, listamos os principais sistemas de informação com as escalas temporais e espaciais disponíveis que podem dar suporte às análises espaciais.


Tabela 1: Nível de detalhe dos principais sistemas de informação em saúde.


2.3 Como os dados espaciais são classificados?

Os eventos na área da saúde que são mais usados nas análises espaciais na vigilância são, geralmente, classificados em:

  • Eventos pontuais: são aqueles que a própria localização já é uma variável de interesse. São registrados individualmente e podem ter diversas outras características associadas (também chamados de atributos, mas não confundir com atributos de objetos do R). São exemplos as localizações de casos de doenças, óbitos, focos de vetores e unidades de saúde. Geralmente, somente o nível local tem o acesso a esses dados.

  • Eventos agregados em áreas territoriais: geralmente, são aqueles dados originalmente individuais, mas que foram agregados segundo alguma unidade territorial, após um cálculo que normaliza a quantidade de eventos com a população daquela unidade. Podemos exemplificar como a taxa de incidência de uma doença por bairros de residência do paciente ou área de abrangência das equipes da Estratégia de Saúde da Família.

Um outro tipo muito comum utilizado nas análises de vigilância ambiental, são os eventos distribuídos de maneira contínua, ou seja, não restritos a um local específico. São exemplos a temperatura, a pluviosidade e a altitude. Por serem contínuos na superfície, sua medição se dá através de pontos coletados por amostra e com posterior estimativa para outros locais onde não houve coleta.

O analista da Vigilância em Saúde se depara o tempo todo com a disponibilidade de dados para esses eventos. O acesso aos dados produzidos no nível local é acessível às equipes de analistas deste nível. Mas, frequentemente, há a necessidade de integrar dados de outros setores (como os dados sobre internações).