Módulo 1

Etnocentrismo, estereótipo e preconceito

A reação diante da alteridade faz parte da própria natureza das sociedades. Em diferentes épocas, sociedades particulares reagiram de formas específicas diante do contato com uma cultura diversa à sua. Um fenômeno, porém, caracteriza todas as sociedades humanas: o estranhamento, que chamamos etnocentrismo, diante de costumes de outros povos e a avaliação de formas de vida distintas a partir dos elementos da sua própria cultura.

Assim, percebemos como o etnocentrismo se relaciona com o conceito de estereótipo, Os estereótipos são uma maneira de “biologizar” as características de um grupo, isto é, considerá-las como fruto exclusivo da biologia, da anatomia. No interior de nossa sociedade, encontramos uma série de atitudes etnocêntricas e biologicistas.

Nas religiões de matriz africana, como o candomblé e a umbanda, nota-se uma maior participação de homossexuais. A mídia constantemente cria personagens caricaturados de “pais de santo gays”. Assim, difunde estereótipos e fortalece o racismo e a homofobia.

O estereótipo funciona como um carimbo que alimenta os preconceitos ao definir a priori quem são e como são as pessoas. Sendo assim, o etnocentrismo se aproxima também do preconceito. Encontramos um exemplo de intolerância religiosa na relação com o candomblé e outras religiões de matriz africana. O preconceito relativo às práticas religiosas afro-brasileiras está profundamente arraigado na sociedade brasileira por essas práticas estarem associadas a negros e negras, grupo historicamente estigmatizado e excluído.

Além das práticas religiosas, em nossa sociedade, existem práticas que sofrem um profundo preconceito por parte dos setores hegemônicos, ou seja, por parte daqueles que se aproximam do que é considerado “correto” segundo os que detêm poder. Seguindo essa lógica, as práticas homossexuais e homoafetivas, são condenadas, vistas como transtorno, perturbação ou desvio à “normal e natural” heterossexualidadel. Foi necessária a contribuição de outros campos do conhecimento para romper com a idéia de “homossexualismo” como doença e construir os conceitos de homossexualidade e de orientação sexual, incluindo a sexualidade como constitutiva da identidade de todas as pessoas. O preconceito contra pessoas com orientação sexual diferenciada vem sendo fortemente combatido pelo Movimento LGBT. Consideradas, no passado, um pecado pela religião (e por muitos até hoje), uma doença pela medicina, um desvio de conduta pela psicologia, as práticas homoeróticas, nas últimas décadas, têm contribuído para a superação do estigma que as reprova e persegue. Embora se trate de um grupo social ainda fortemente estigmatizado, é inegável que a atuação dos movimentos sociais tem provocado mudanças no imaginário, e agregado conhecimentos sobre a homossexualidade, de maneira a tirá-la da “clandestinidade”.

Questões de gênero, religião, raça/etnia ou orientação sexual e sua combinação direcionam práticas preconceituosas e discriminatórias da sociedade contemporânea. Se o estereótipo e o preconceito estão no campo das idéias, a discriminação está no campo da ação, ou seja, é uma atitude.

O predomínio de livros didáticos e paradidáticos em que a figura da mulher é ausente ou caracterizada como menos qualificada que o homem contribui para uma imagem de inferioridade feminina, por um lado, e superioridade masculina, por outro. Silenciosamente, vão sendo demarcados, com uma linha nada imaginária, os lugares dos homens e os lugares das mulheres. E os homens e as mulheres que fugirem desse roteiro pré-definido terão seus valores humanos ameaçados ou violados. O grupo social, respaldado por um conjunto de idéias machistas, exercerá seu controle e fortalecerá os mecanismos de exclusão e negação de oportunidades iguais.

Os módulos II e III nos trarão outras reflexões e exemplos relacionados às discriminações de gênero e orientação sexual, respectivamente, apresentando os principais desafios e as conquistas dos movimentos de defesa desses grupos. É importante destacar que há mudanças acontecendo, por exemplo, no que se refere às mulheres.

A superação das discriminações implica a elaboração de políticas públicas específicas e articuladas. Os exemplos relativos às mulheres, aos homossexuais masculinos e femininos, às populações negra e indígena tiveram a intenção não apenas de explicitar que as práticas preconceituosas e discriminatórias – misoginia, homofobia e racismo – existem no interior da nossa sociedade, mas também que essas mesmas práticas vêm sofrendo profundas transformações em função da atuação dos próprios movimentos sociais, feministas, LGBT, negros e indígenas. Tais movimentos têm evidenciado o quanto as discriminações se dão de formas combinadas e sobrepostas, refletindo um modelo social e econômico que nega direitos e considera inferiores mulheres, gays, lésbicas, transexuais, travestis, negros, indígenas.

A desnaturalização das desigualdades exige um olhar transdisciplinar, que, em vez de colocar cada seguimento numa caixinha isolada, convoca as diferentes ciências, disciplinas e saberes para compreender a correlação entre essas formas de discriminação e construir formas igualmente transdisciplinares de enfrentá-las e de promover a igualdade.

avançar
A convivência com a diversidade implica o reconhecimento o respeito, e a valorização do/a outro/a, e supõe não ter medo daquilo que se apresenta inicialmente como diferente. Esses são passos essenciais para a promoção da igualdade de direitos.